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Ana Gonzaga

Rosário Cardoso







domingo, 22 de novembro de 2009

José Saramago, Ensaio sobre a Cegueira


“Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.”
Nascemos dotados de uma capacidade que nos permite ter uma noção das formas que existem no mundo, das cores, da beleza e da diversidade que o revestem – ver. Mas nem todos vêm. Olham. Olham imagens, mas a o hábito, e sobretudo a indiferença não possibilitam que estas imagens sejam observadas, “vistas”. Assim, reparar, ver, não é nada mais do que libertar-se da superficialidade da visão para aprofundar o interior do que é o homem e, finalmente, conhecê-lo.

A partir desata frase – “Se podes ver, repara.”- Saramago constrói um mundo que literalmente não vê. Esse “não ver” não é uma doença que surge de outro mundo, é uma doença que sempre existiu na nossa sociedade.

Basta olhar à nossa volta: temos tudo. Sistemas que asseguram o nosso bem-estar. Créditos, bancos, mercados, fábricas, escritórios, centros de saúde e apoios para idosos. Temos um estado, um governo que organiza tudo. Para fazer parte desta sociedade basta adaptar-se às regras e pagar impostos. Acreditamos que somos infalíveis e que estamos seguros. O castelo de cartas está perfeito. Mas … se uma carta deste castelo cair? Se todo o castelo ruir, como poderemos sobreviver?

Estamos tão habituados ao nosso mundo que “perdemos a nossa vista”; a superficialidade com que nos fazemos “felizes” impede-nos de reparar para além das aparências.

José Saramago vê então a cegueira como uma alegoria, configurando o estado de crise em que vive a nossa sociedade. Os seus pilares são tão fracos que basta um vento para destruí-los. É por isso que a sociedade descrita pelo autor não é capaz de se organizar quando os seus membros cegaram. A nossa sociedade não é mais do que um ser vivo que precisa de comida e de bebida. Por que razão é que as personagens de “Ensaio sobre a cegueira” se comportam como animais selvagens ao terem perdido a luz dos olhos? Onde está o “fato” que os distinguia dos animais? No manicómio, para onde são evacuados os cegos, as regras do humano são quebradas, em nome da “força do mais forte”. Aí, o instinto de sobrevivência das personagens toma conta destas. No manicómio, os anéis, a prata e o ouro não valem nada. É necessário chegar até à comida.

“Um corpo também é um sistema organizado, está vivo enquanto se mantém organizado, E como poderá uma sociedade de cegos organizar-se para que viva, Organizando-se, organizar-se já é, de uma certa maneira, começar a ter olhos, terás razão, talvez, mas a experiência desta cegueira só nos trouxe morte e miséria, os meus olhos, tal como o teu consultório, não serviram para nada.”

Enfim… a obra é um convite de José Saramago para pensarmos na humanidade, no mundo que ainda não aprendemos a olhar.

Ao ler este livro sentia a confusão, o medo que circulava pela cidade. Quando fechava os olhos e os abria de novo, sentia-me feliz, grata pela luz e pelas cores que chegavam aos meus olhos.

O médico e a sua mulher, a única personagem que não cega, a única luz no escuro, talvez o resto de amor, de sensibilidade e de juízo que existe dentro de nós, foram para mim os heróis da história. Quase que me sentia responsável por esta última, não poderia acabar de ler e deixá-la sozinha. O que mais me fascinou no livro foi a possibilidade de “sentir” como se estivesse nesse mundo imaginado por Saramago. Sentir. Ver. Apreciar. Reflectir. VIVER.


Laila Franke

2 comentários:

  1. Ainda me lembro quando a Laila fez a apresentação desse livro e nos mandou fechar os olhos.
    Foi, sem dúvida alguma, especial.
    Foi essa apresentação que me levou a querer ler o livro.

    Um texto fantástico :) gostei imenso.
    Silvana

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